Em Março de 2011 defendi publicamente a tese de mestrado. Neste dia cumpriu-se mais um objetivo e concluí uma grande etapa que determinei ultrapassar. Partilho convosco, o enquadramento teórico e as questões que me levaram a desbravar este caminho, para melhor compreender se existiam alterações nas interações cuidadores-criança, pós-programa que desenvolvi com quarenta díades, durante quatro semanas em nove instituições (CAT), distribuídas pelos Distritos de Lisboa, Almada e Santarém.
A criança e a necessidade da sua protecção como investimento no futuro da Sociedade, tem sido alvo de debate e investigação, bem como de reflexo de mudanças ao nível da Intervenção Comunitária. Esta é uma questão que tem preocupado os técnicos, pois urge uma melhor definição e conceptualização da prática, para garantir a existência de intervenções assertivas e eficazes.
Para além disso, importa ter em conta que as crianças em acolhimento institucional, ficam privadas de cuidados parentais, num contexto desconhecido e rodeada de pessoas que nunca viram antes. Alem do mais, à instituição é exigida a satisfação das necessidades básicas da criança, no cumprimento da sua função “assistencial”, descurando-se muitas vezes a componente afectiva e relacional.
Esta preocupação não é recente, fazendo a literatura referência a vários estudos que se centram no impacto do acolhimento institucional no desenvolvimento da criança.
Se por um lado existem dúvidas pertinentes face ao acolhimento institucional e à qualidade dos cuidados nele prestados, não se poderá ignorar a necessidade da sua existência.
Nesta perspectiva, será necessário dispor de espaços adequados e, essencialmente, de equipas de profissionais competentes e conscientes das repercussões da sua prática no desenvolvimento da criança. Para além disso, sendo prioritária a defesa do “superior interesse da criança”1, torna-se necessário traçar linhas objectivas que orientem a prática dos cuidadores, capacitando-os para o sucesso na intervenção. Deste modo, afigura-se imprescindível o desenvolvimento de programas que potenciem uma intervenção de qualidade ao nível das interacções no contexto de acolhimento institucional, que promovam a formação e consequentemente a modelagem de interacções positivas.
Acresce ainda que a intervenção precoce é uma ferramenta indispensável na ajuda aos profissionais, para dar resposta às necessidades ao longo das diversas fases de desenvolvimento da criança (Papalaia, Old & Feldman., 1999).
Na literatura é possível identificar programas internacionais de intervenção precoce nas interacções pais-filhos, como o “Parents as Teachers”ou “Healthy Families América”, resultando em alterações ao nível da auto-estima parental, na redução de conflitos e no comportamento da criança.
Em Portugal, investigação na área da intervenção precoce nas interacções pais-filhos é insuficiente. O mesmo se verifica no contexto de acolhimento institucional nas interacções cuidador-criança. Não obstante, foi possível identificar o programa “Desenvolver a Sorrir” (Zuzarte, 2008), que define como objectivo geral, a intervenção precoce ao nível das interacções e da vinculação pais-filhos. Foi desenvolvido com 19 famílias sinalizadas ao Sistema de Protecção de Menores Português, que beneficiavam de acompanhamento por parte das Equipas de Intervenção Comunitária com Famílias “de Risco” (63,1%) e da Comissão de Protecção de Crianças e Jovens (52,6%).
Dada a necessidade de intervenção nas interacções em acolhimento e tendo a autora deste programa demonstrado interesse em “generalizar a sua aplicação a populações de risco”, surgiu o objectivo de implementá-lo em contexto de acolhimento temporário.
Assim, importa reflectir, questionar e intervir numa perspectiva da alteração de práticas educativas e de profissionalização de cuidados. Que cuidados recebem as crianças actualmente acolhidas? Permanecendo em acolhimento mais tempo que o desejável, que poderá ser feito para diminuir o impacto da institucionalização?
Tendo em conta que alguns autores (e.g Bazon, 1995; Morais & cols., Yunes & cols., 2004) apontam a falta de formação dos cuidadores, como obstáculo à prática, existirão, à semelhança do que acontece com amostras de pais, mudanças nas interacções estabelecidas em acolhimento institucional se as diades participarem em programas de intervenção?
Estas questões serviram de impulso ao presente estudo que poderá trazer uma nova perspectiva das interacções em acolhimento, conferindo-lhe credibilidade e certificação.
Deste modo, será possível “ambicionar” que a intervenção com crianças acolhidas em idades precoces, prime pela qualidade, através de investimento nas relações, minimizando, assim os efeitos dos cuidados institucionais.
Conceição Pereira Amor d`3ducação